A Academia Imperial de Belas Artes teve sua origem no projeto da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, aprovado pelo decreto de 12 de agosto de 1816, que concedeu pensões a diversos artistas franceses que vieram morar no Brasil. O projeto inicial de criação esteve relacionado não só às artes, mas também aos estudos das ciências naturais, físicas e exatas, voltados para o desenvolvimento do reino. Os professores da Academia eram, em sua maioria, do grupo que ficaria conhecido como “missão francesa”. Liderados por Joaquim Lebreton, a equipe contava ainda com Pedro Dellon, Jean-Baptiste Debret, Nicolas-Antoine Taunay, Auguste-Marie Taunay, Auguste-Henri-Victor Grandjean de Montigny, Charles-Simon Pradier, François Ovide, Charles-Henri Levasseur, Louis Meunié e François Bonrepos. Em 1820 dois decretos, ambos datados de 23 de novembro, alteraram o nome da instituição para Real Academia de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil e, em seguida, para Academia de Artes, além de terem-lhe conferido um estatuto (CAMARGO, 2012).
Nos primeiros anos de funcionamento da academia, as atividades dos artistas voltavam-se mais para a Corte e ofícios particulares do que àqueles de caráter pedagógico. O trabalho era dificultado não só pelas limitações de espaço, mas também pelo ressentimento e pela hostilidade dos artistas portugueses aqui residentes em relação aos mestres franceses e seus discípulos (BARATA, 1985).
Em 1826 o prédio projetado por Grandjean de Montigny ficou pronto e a escola passou a funcionar plenamente, com o nome de Academia Imperial de Belas Artes. Mas foi somente em 1831, pelo decreto de 30 de dezembro, que teve um novo regulamento aprovado. Nesse regulamento é possível perceber que a academia passava a dedicar-se exclusivamente às artes; as atividades relativas às ciências naturais, físicas e exatas já não integravam mais seu curso. O ensino dividia-se nas especialidades de pintura histórica, paisagem, arquitetura e escultura. Além dessas quatro divisões havia também aulas de desenho, anatomia e fisiologia, funcionando como disciplinas complementares aos quatro cursos da escola.
Nos anos de 1830, o Império viveu um período de crise, marcado por diversas revoltas provinciais e disputas partidárias. Porém, ao final da década a situação começa a se apaziguar, sobretudo, após o golpe da maioridade em 1840. Essa estabilidade política veio acompanhada de investimentos em instituições educacionais e artísticas, o que integrava um projeto de fortalecimento da monarquia e do Estado imperial, e a unificação nacional através da cultura (MATTOS, 1994; SCHWARCZ, 1998). Em 1853, com a ascensão do gabinete chefiado por Luís Pedreira do Couto Ferraz (1853-1857), um grande projeto de reforma educacional foi idealizado e diversas instituições dessa natureza foram reformadas no Império, como por exemplo as faculdades de medicina e de direito. A Academia Imperial de Belas Artes também fez parte do projeto reformista, e as mudanças na instituição ocorreram quando Manuel de Araújo Porto Alegre assumiu a sua direção, entre 1854 e 1857. O pintor idealizou os novos estatutos, que foram aprovados pelo decreto n. 1.603, de 14 de maio de 1855 (SQUEFF, 2000).
De acordo com os estatutos de 1855, a academia passou a ter cinco especializações – arquitetura, escultura, pintura, ciências acessórias e música – cada uma composta por disciplinas específicas, sendo estabelecido o que deveria ser ensinado em cada uma das aulas. No curso de arquitetura, seriam ministrados desenho geométrico, de ornatos e de arquitetura civil. Já no de escultura, os alunos aprenderiam a arte dos ornatos, gravura em medalhas e pedras preciosas e estatuária. Nas aulas de pintura, estudariam desenho figurado, paisagem, flores e animais e pintura histórica. O curso de ciências acessórias seria composto por cadeiras de matemática aplicada, anatomia e fisiologia das paixões e história da arte, estética e arqueologia. A quinta especialização seria em música, já que o conservatório foi incorporado à academia. Além das aulas acima relacionadas existiria ainda a de “modelo-vivo”.
Um aspecto interessante nesse período foi a preocupação em também ensinar o desenho e a escultura aplicados à indústria. O termo ‘desenho industrial’ aparece em alguns trechos do regulamento, o que demonstra uma tendência em voltar a academia para uma formação mais técnica, além da artística. Em meados do século XIX, o Brasil estava começando a se modernizar, algumas indústrias estavam se instalando e tornava-se necessária a formação de mão-de-obra capacitada para essas atividades.
A administração de Porto Alegre implementou um plano de formar artistas e artífices, através do ensino voltado para cada área. Os alunos que frequentavam a academia até então eram, em sua maioria, de origem humilde e com baixa escolaridade, o que limitava uma formação mais aprofundada. Para esses alunos, a solução seria um curso de caráter prático, voltado para atividades manuais. Por outro lado, era necessário formar artistas que pudessem cumprir a missão de transformar o Brasil numa nação civilizada, seguindo uma perspectiva mais erudita. Sendo assim, foram feitos investimentos para a formação artística mais completa, com estudos mais específicos de base teórica (SQUEFF, 2000).
Em 1859 o decreto n. 2.424, de 25 de maio, alterou vários aspectos do regulamento de 1855 e dividiu as aulas em um curso diurno, voltado para lições artísticas, e outro noturno, dedicado à formação prática. A aula noturna recebeu um grande número de alunos em seus primeiros anos de existência, porém, com a criação de outros cursos de artífices na Corte – como o do Liceu de Artes e Ofícios – entrou em decadência e foi suprimida em 1888 (CARDOSO, 2008).
Com o declínio do Império, os financiamentos do imperador cessaram e a escola entrou em um período de crise. Durante o Segundo Reinado, a academia foi apadrinhada por d. Pedro II, que investia em muitos artistas e patrocinava prêmios e viagens ao exterior. Em contrapartida, grande parte das obras produzidas visaram a exaltação do monarca ou a criação de uma identidade genuinamente brasileira, aos moldes do romantismo literário, tendo a natureza e o indígena como elementos de destaque.
Até o início da República, a academia manteve a regulamentação aprovada em 1850, quando o decreto n. 983, de 8 de novembro de 1890, aprovou seus novos estatutos e alterou seu nome para Escola Nacional de Belas Artes.
Louise Gabler
19 out. 2015
Bibliografia
BRASIL. Decreto de 30 de dezembro de 1831. Dá estatutos à Academia das Belas Artes. Coleção das leis do Império do Brasil. Rio de Janeiro, parte 2, p. 91-98, 1875.
____. Decreto n. 1.603, de 14 de maio de 1855. Dá novos estatutos à Academia das Belas Artes. Coleção das leis do Império do Brasil. Rio de Janeiro, parte 2, p. 402, 1856.
____. Decreto n. 983, de 8 de novembro de 1890. Aprova os Estatutos para a Escola Nacional de Belas-Artes. Decretos do Governo Provisório dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, décimo primeiro fascículo, p. 3533, 1891.
CAMARGO, Angélica Ricci. Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios. In: Dicionário da Administração Pública Brasileira do Período Colonial (1500-1822). Disponível em: <https://goo.gl/1m3fdW >. Acesso em: 19 out. 2015.
CARDOSO, Rafael. A Academia Imperial de Belas Artes e o Ensino Técnico. In 19&20, Rio de Janeiro, v. III, n. 1, jan. 2008. Disponível em: <https://goo.gl/b2NUvd>. Acesso em: 23 jul. 2014.
MATTOS, Ilmar. O Tempo Saquarema. Rio de Janeiro: ACCESS, 1994.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. As Barbas do Imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
SQUEFF, Letícia Coelho. A Reforma Pedreira na Academia de Belas Artes (1854-1857) e a constituição do espaço social do artista. In Cadernos Cedes. Ano XX, n. 51, nov/2000. p. 103-118.
Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional
BR AN,RIO 22 Decretos do Executivo – Período Imperial
BR AN,RIO 23 Decretos do Executivo – Período Republicano
BR AN,RIO 25 Decretos S/N
BR AN,RIO 2H Diversos – SDH – Caixas
BR AN,RIO Q2 Félix Emílio Taunay
BR AN,RIO 92 Série Educação – Cultura – Belas-Artes – Bibliotecas – Museus (IE7)
BR AN,RIO 99 Série Fazenda – Administração (IF2)
BR AN,RIO AF Série Justiça – Administração (IJ2)
Referência da imagem
Estereoscopia Rodrigues & Co. Rio de Janeiro, [1890-1900] Fotografias Avulsas. BR_RJANRIO_O2_0_FOT_00444_052
Este verbete refere-se apenas à trajetória do órgão no período imperial. Para informações entre 1500-1822 e 1889-1930, consulte Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios e Academia de Belas-Artes.