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Botica Real Militar

Publicado: Sexta, 11 de Novembro de 2016, 12h18 | Última atualização em Sexta, 06 de Abril de 2018, 18h53 | Acessos: 2573

A Botica Real Militar foi criada pelo decreto de 21 de maio de 1808, anexa ao Hospital Militar e da Marinha, com a atribuição de se manipular dentro dele os remédios de botica para que a toda e qualquer hora se acudisse aos enfermos com os específicos necessários (BRASIL, 1891, p. 43). Sua criação deve ser compreendida como parte do processo de institucionalização da medicina no Brasil, iniciado com a vinda da família real e a autorização de funcionamento dos primeiros cursos de formação médico-cirúrgica na colônia, ambos em 1808: a Escola de Cirurgia da Bahia e a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro.

Ao longo do período colonial, o cuidado com a saúde foi uma atribuição partilhada por diversos agentes de cura, como cirurgiões, físicos, sangradores, barbeiros, parteiras e seus aprendizes, e a habilitação para o exercício da arte de curar não garantiria o seu monopólio. A prática da medicina ficaria também a cargo da assistência prestada nas enfermarias jesuíticas, nos hospitais das misericórdias e nos militares, que, na maioria das vezes, representavam a única possibilidade de assistência médica e fornecimento de medicamentos no período colonial. Com a expulsão dos jesuítas do Brasil, em 1759, seriam instalados, nas principais vilas da colônia, hospitais destinados ao tratamento das tropas, chamados de hospitais reais militares. O Hospital Real Militar do Rio de Janeiro foi estabelecido em 1768, em substituição à enfermaria do Quartel das Naus, localizada no Morro de São Bento (SANTOS FILHO, 1947, p. 366).

Até o século XVIII, a fiscalização do exercício da medicina e da cirurgia era exercida pelos delegados do físico-mor e do cirurgião-mor, segundo regulamentos expedidos em Portugal para o Reino e seus domínios ultramarinos, atribuição partilhada pelo Senado da Câmara. Em 1744, seria aprovado o regimento geral dos delegados ou juízes comissários do cirurgião-mor e físico-mor nos estados do Brasil, que determinava que o regulamento de inspeção das boticas portuguesas fosse observado nesta colônia (ibidem, p. 112-113; ABREU, 1900, p. 184). A partir de 1782, a jurisdição sobre a prática médica e cirúrgica seria exercida pelos delegados da Junta do Protomedicato, órgão que substituiria o físico-mor e o cirurgião-mor do Reino. Aos curadores era necessário obter, junto às instâncias fiscalizadoras, a “carta de examinação”, que lhes concedia o direito ao exercício da arte de curar, sendo necessária a apresentação de habilitação ou a realização de avaliações perante uma junta examinadora (ABREU, 1900, p. 299).

No caso dos boticários, eram sua atribuição o preparo, o comércio de drogas e o aviamento de receitas (MARQUES, 1999, p. 304). Em Portugal, ocupavam uma posição hierárquica inferior à dos físicos e poderiam ser licenciados pela Universidade de Coimbra ou ingressar no ofício na condição de aprendiz, seguindo manuais como o Exame de boticários ou a Coletânea farmacêutica (ibidem, p. 168-171). Porém, seria apenas em 1772, com a reforma da Universidade de Coimbra, empreendida pelo marquês de Pombal, que a formação do boticário receberia uma nova organização, com aulas no Laboratório Químico e no Dispensário Farmacêutico, ainda que continuasse sendo um ensino fundamentalmente prático (PITA, s.d.).

Criada a Botica Real Militar, em 1808, foi nomeado para o cargo de boticário Joaquim José Leite Carvalho, e sua estrutura incluía um oficial, um aprendiz e um servente. Pelo decreto de 22 de maio de 1810, a Botica é tratada como laboratório farmacêutico, ficando o seu boticário sujeito ao lente da cadeira de matéria médica e farmacêutica, o dr. José Maria Bomtempo. A cadeira de medicina clínica, teórica e prática, estabelecida pelo decreto de 12 de abril de 1809, era parte do curso da Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica, cujas aulas funcionavam no Hospital Real Militar, estabelecido no Morro do Castelo, nas antigas instalações do Colégio dos Jesuítas. Destinava-se a formar cirurgiões que tivessem também “os princípios elementares da matéria médica e farmacêutica”, devendo ser ministrada aos ajudantes de cirurgia e outros alunos que frequentassem o hospital. Segundo esse decreto, para a instrução dos alunos e lições de prática, era necessário ir ao laboratório, o que criava um conflito de jurisdição entre o lente e o boticário. O problema foi contornado com a subordinação do boticário facultativo ao professor da cadeira médica e cirúrgica, conforme sancionado pelos estatutos análogos a este assunto da Universidade de Coimbra.

Em 1831, a lei de 15 de novembro, que orçou a receita e fixou a despesa para o ano financeiro de 1832-1833, autorizou o governo a reformar os hospitais militares existentes ou substituí-los por hospitais regimentais, considerados menos onerosos e mais adequados à organização da tropa (PONDÉ, 1994, p. 99). De fato, o decreto de 17 de fevereiro de 1832 extinguiu os hospitais militares, substituindo-os por hospitais regimentais, dispondo o art. 22 que os medicamentos para os hospitais regimentais seriam fornecidos por uma ou mais boticas particulares, não fazendo qualquer referência à manutenção da Botica ou de um laboratório farmacêutico nas unidades instaladas no Rio de Janeiro. Da mesma forma, a Botica Militar não consta na legislação que fixava a despesa para os anos financeiros subsequentes à criação dos hospitais regimentais, fazendo referência apenas a estes órgãos e à “despesa de botica”.


Dilma Cabral

7 out. 2015


Bibliografia

ABREU, E. A fisicatura-mor e o cirurgião-mor dos Exércitos no Reino de Portugal e Estados do Brasil. Revista do IHGB, v. 63, n. 101, p. 154-306, 1900.

BRASIL. Decreto de 21 de maio de 1808. Cria uma botica no Hospital Militar e da Marinha. Coleção das leis do Brasil, Rio de Janeiro, p. 43, 1891.

FIGUEIREDO, Betânia Gonçalves. A arte de curar: cirurgiões, médicos, boticários e curandeiros no século XIX em Minas Gerais. Rio de Janeiro: Vício e Leitura, 2002.

MARQUES, Vera Regina Beltrão. Natureza em boiões: medicinas e boticários no Brasil setecentista. Campinas: Ed. Unicamp, 1999.

PITA, João Rui. Resenha histórica [da Faculdade de Farmácia de Coimbra]. Disponível em: <https://goo.gl/YSZQKb>. Acesso em: 10 jun. 2008.

PONDÉ, Francisco de Paula e Azevedo. Organização e administração do Ministério do Exército. Brasília: Centro de Documentação, Informação e Difusão Graciliano Ramos; Biblioteca do Exército, 1994.

SANTOS FILHO, Licurgo dos. História da medicina no Brasil: do século XVI ao século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1947. v. 1.


Referência da imagem

Sir Henry Chamberlain. Vistas e costumes da cidade e arredores do Rio de Janeiro em 1818-1820. Rio de Janeiro: Kosmos,1943. OR_1985

 

Este verbete refere-se apenas à trajetória do órgão no período imperial. Para informações entre 1808 e 1821, consulte o verbete no Dicionário de Administração Colonial através do link: Botica Real Militar

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