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Curso de Agricultura da Bahia

Publicado: Quarta, 09 de Novembro de 2016, 18h23 | Última atualização em Sexta, 04 de Setembro de 2020, 13h08 | Acessos: 3174

O Curso de Agricultura da Bahia foi instituído pela carta régia de 25 de junho de 1812, visando estimular a instrução pública dos habitantes da capitania nos conhecimentos próprios desse ramo das ciências naturais, além de servir de modelo para o estabelecimento de cursos similares nas demais regiões do Brasil. Tal iniciativa partiu do diagnóstico da metrópole sobre o lento progresso e aperfeiçoamento da exploração agrícola da colônia, manifestado pelo desconhecimento de novas culturas, pela falta dos bons princípios agronômicos e pela ignorância quanto aos processos e máquinas rurais.

No século XVIII, o pensamento ilustrado conferiu à ciência um papel central na promoção do progresso material da sociedade, o que contribuiu para a valorização das inovações técnicas e do caráter utilitário do saber científico. No caso português, o reformismo da Ilustração teve por desafio analisar e superar as causas do atraso e da decadência do país em relação às nações mais desenvolvidas da Europa, colocando os temas econômicos e seu vasto império colonial no centro dessa reflexão.

Com isso, o caráter instrumental da ciência passou a ter grande peso nas políticas portuguesas no período, reforçando a ideia da agricultura como fonte de riqueza. Tal fato proporcionou a produção de inúmeras memórias científicas na Academia Real das Ciências de Lisboa, além de tratados, periódicos e manuais práticos sobre a questão. A Coroa incorporou a crença de que o conhecimento da natureza permitiria ao homem maior domínio e uma manipulação mais eficiente dos recursos naturais, assim como o aproveitamento racional da produção agrícola, introduzindo novas culturas e métodos de produção, concorreria para o desenvolvimento econômico da nação portuguesa.

A transferência da família real para o Brasil em 1808 afetou profundamente a ordenação jurídica e econômica da colônia, e uma complexa estrutura administrativa foi instalada para a manutenção da corte portuguesa no país. A abertura dos portos, a liberdade de cultivar produtos que antes não eram permitidos e a revogação da proibição do estabelecimento de fábricas e manufaturas no Brasil fizeram parte desta conjuntura de estímulo à produção colonial (Lobo, 1980, p. 25). A criação da Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação também integrou esse esforço de empreender uma política econômica que conseguisse suplantar as ideias mercantilistas que haviam prevalecido no período colonial, deslocando o enfoque da circulação de mercadorias para a produção, o que marcou a regência de d. João (Lobo, 1980, p. 19-23).

Nesse contexto, a iniciativa real de criar o curso na Bahia visava franquear e facilitar o acesso aos “bons princípios de agricultura”, por se tratar de uma arte que demandava o acúmulo de conhecimentos diversos e que, até o momento, não fora ensinada de forma geral e pública, o que implicava o seu lento progresso e aperfeiçoamento.

O curso de agricultura tinha duração de dois anos, e foi nomeado como professor, por seus conhecimentos teóricos e práticos, Domingos Borges de Barros. Futuro visconde de Pedra Branca, Borges de Barros foi aluno do Colégio dos Nobres e formou-se em filosofia natural pela Universidade de Coimbra, além de ter estudado ciências naturais em Paris. Foi o maior colaborador do jornal O Patriota, periódico dedicado à divulgação das ciências e das letras, no qual publicava notícias da Europa e traduções de artigos sobre agronomia e química. Além de lente, ele tinha a incumbência de dirigir os trabalhos no Jardim Botânico, na cidade da Bahia, que servia também como escola de agricultura (Freitas, 2006, p. 59).

Na citada carta régia de junho de 1812, constavam também as diversas atribuições do titular da cadeira do curso, cabendo-lhe ensinar “os princípios de botânica, química e medicina, indispensáveis à inteligência da entendida cultura, e economia, e arquitetura rural”; aplicar as doutrinas estudadas aos princípios da agricultura; o aprimoramento das culturas “indígenas e exóticas”; fomentar a “invenção e prática dos melhores métodos de propagar os vegetais, a física dos bosques, o corte e reprodução das matas, os prados artificiais, a criação dos animais e o aproveitamento dos seus produtos”.

Além dessas atribuições, o professor do curso de agricultura deveria organizar os compêndios das doutrinas que fossem objeto de seu curso, no prazo de seis anos. Eles seriam impressos, se aprovados pelo rei, e se destinariam também aos cursos de agricultura que se pretendia criar nas outras capitanias.

Cabiam ainda, ao professor, a direção do curso e do Jardim Botânico, que se mandava estabelecer, e a tarefa de descrever os resultados das observações feitas nas viagens anuais pela capitania, além de realizar esforços para aquisição e organização de um gabinete de modelos e máquinas rurais de produtos mineralógicos e botânicos necessários à demonstração das doutrinas que ensinasse. Ao fim de cada colheita, deveria distribuir pelas câmaras municipais da capitania as sementes que recolhesse ao Jardim Botânico.

Ainda segundo a carta régia de 25 de junho de 1812, o empreendimento não deveria contar apenas com financiamento real, pois também competia ao professor apresentar um plano capaz de prover financeiramente a agricultura e as “artes que lhe são relativas”. Para tal seriam recolhidas contribuições voluntárias, que cobririam as despesas com viagens e com a impressão de textos acerca dos “conhecimentos agronômicos”, além de formarem um fundo que subsidiaria o estabelecimento do Jardim Botânico, uma coleção de instrumentos e máquinas úteis à agricultura e prêmios para aqueles que se destacassem com inventos ou melhoramentos relativos à cultura e às fábricas rurais.

O curso ficava sob a inspeção do governador-geral da capitania da Bahia, correndo tais matérias pela Secretaria de Estado dos Negócios do Brasil. O professor de agricultura gozava, ainda, das honras, privilégios e isenções concedidas aos lentes da Real Academia Militar.


Rodrigo Lobo
Nov. 2011

 

Fontes e bibliografia
ARAÚJO, Nilton de Almeida. Da cadeira de agricultura ao anel de engenheiro agrônomo: ciência, civilização e estado imperial no coração da produção açucareira baiana. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, 24., 2007, São Leopoldo. Disponível em: https://goo.gl/MWjFuH. Acesso em: 7 jun. 2008.

FREITAS, Maria Helena. Considerações acerca dos primeiros periódicos científicos brasileiros. Ciência da Informação, v. 35, n. 3, p. 54-66, set.-dez. 2006.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. História político-administrativa da agricultura brasileira (1808-1889). Brasília: Ministério da Agricultura, 1980.

NUNES, Antonietta d’Aguiar. A educação na Bahia durante os governos de d. Maria I e de d. João, seu filho (1777-1821). Revista do Mestrado em Educação, Universidade Federal de Sergipe, v. 7, p. 37-50, jul.-dez. 2003.

NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial (1777/1808). São Paulo: Hucitec, 1979.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). O Império luso-brasileiro (1750-1822). Lisboa: Estampa, 1986. (Nova História da Expansão Portuguesa, v. 8).


Referência da imagem
Encyclopédie, ou, Dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers, par une société de gens de lettres. Paris: Briasson, 1751-1780. Arquivo Nacional, OR_1896_V1_PL04

 

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