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Conselho Superior das Minas

Publicado: Quinta, 02 de Dezembro de 2021, 06h26 | Última atualização em Quarta, 27 de Março de 2024, 18h39 | Acessos: 1687
Homens diante das máquinas de sondagem na mina de Caué, em Itabira, Minas Gerais, década de 1920
Homens diante das máquinas de sondagem na mina de Caué, em Itabira, Minas Gerais, década de 1920

O Conselho Superior das Minas foi criado pelo decreto n. 2.933, de 6 de janeiro de 1915, com a finalidade de estudar e emitir parecer sobre todas as questões técnicas, econômicas e de direito privado referentes à mineração. Além disso, cabia ao conselho organizar as regras técnicas para garantir a proteção do solo e a segurança do pessoal envolvido nos trabalhos de mineração (Brasil, 1915).

A Constituição de 1891, ao vincular a propriedade das minas à propriedade do solo, promoveu uma ruptura em relação ao regime anterior. No período colonial, vigorou o chamado sistema regaliano ou dominial, ou seja, a propriedade mineral pertencia à Coroa portuguesa, regulada pelas Ordenações Manuelinas e Filipinas, e por uma extensa legislação que estabeleceu seus direitos e uma estrutura administrativa encarregada de seu controle e fiscalização. Após a Independência, o princípio dominial foi mantido, apesar de não estar presente na Constituição de 1824, e as minas foram consideradas como propriedade do Império (Corrêa, 2018, p. 205-206; Ribeiro, 2006, p. 5).

Essa questão apareceu nos trabalhos da primeira Assembleia Constituinte republicana, nos quais prevaleceram os interesses dos proprietários de terras, em detrimento de outros setores da economia, tendo como uma das principais bandeiras a defesa do federalismo (Corrêa, 2018, p. 203). Sob a inspiração de princípios liberais, o artigo 72 da Constituição de 1891 definiu que as minas situadas em terrenos particulares seriam de propriedade dos seus donos, salvo as limitações que fossem estabelecidas por lei a bem da exploração da mineração (Brasil, 1891). Com isso, a proposta dos constituintes visava “estimular a livre iniciativa e o aumento da exportação de minério”, seguindo o modelo de exploração do subsolo realizado nos Estados Unidos (Corrêa, 2018, p. 206). Instituiu-se, desse modo, o chamado sistema de acessão ou fundiário, no qual a propriedade do solo abrangia a do subsolo, posteriormente fixado pelo Código Civil de 1916 (Feitosa; Ataíde, 2017, p. 16).

Além de garantir a propriedade das minas aos particulares, a Carta Magna de 1891, em seu artigo 64, delimitou que as minas, tal como as terras devolutas, situadas nos estados pertenceriam a eles, cabendo à União apenas a porção do território indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais (Feitosa; Ataíde, 2017, p. 15-16; Brasil, 1891).

O sistema de acessão foi objeto de críticas, e vários projetos de lei sobre as minas foram apresentados nas primeiras décadas da República. Em 1903, o deputado João Pandiá Calógeras propôs a criação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados para organizar o regime jurídico das minas e elaborar um plano de auxílio para o desenvolvimento da indústria da mineração. Mas foi somente em 1915 que se aprovou o primeiro ato nessa direção, o decreto n. 2.933, que regulou a propriedade das minas (Sarmento, 1976, p. 358; Corrêa, 2018, p. 210; Paiva, 1967, p. 7).

O ato, conhecido como Lei Calógeras ou Pandiá Calógeras, que, naquele momento estava à frente do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, representou uma primeira tentativa de estabelecer as limitações “a bem da exploração da mineração” previstas na Constituição (Ribeiro, 2006, p. 6).

A Lei Calógeras determinou que as minas constituíam propriedades distintas do solo, podendo ser alienadas isoladamente. Com isso, procurou-se atenuar o princípio de acessão, prevendo os casos ou condições pelos quais as minas poderiam ser desapropriadas e exploradas por terceiros (Nogueira, 1997, p. 62; Feitosa; Ataíde, 2017, p. 16).

A lei também dispôs sobre a pesquisa e a concessão das minas de domínio da União, definindo os procedimentos necessários para a sua execução; criou a polícia da mineração, formada por engenheiros nomeados pelo governo e pagos pelos concessionários, destinada à fiscalização do serviço de pesquisa e de lavra das minas; e instituiu o Conselho Superior das Minas.

Presidido pelo ministro da Agricultura, Indústria e Comércio, o conselho era composto pelos diretores da Escola Politécnica e da Escola de Minas de Ouro Preto, pelos lentes catedráticos de metalurgia e de lavra de minas das mesmas escolas, pelo chefe do Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil, pelo diretor da Estrada de Ferro Central do Brasil, por três representantes de empresas mineradoras do país e pelo consultor-geral da República. O trabalho de secretaria ficaria a cargo do Serviço Geológico e Mineralógico do Brasil, órgão criado em 1907, pelo decreto n. 6.323, de 10 de janeiro, com a finalidade de estudar a estrutura geológica, a mineralogia e os meios e recursos minerais do território brasileiro.

Ao conselho ainda caberia a resolução das dúvidas relativas à classificação legal das substâncias minerais, e auxiliar o governo federal na decisão sobre os casos de caducidade da concessão das lavras, quando houvesse abandono da mina ou interrupção dos trabalhos por mais de um ano, não cumprimento dos prazos determinados pelo decreto de concessão, ou se o concessionário deixasse de cumprir as normas previstas ou fosse declarado incapaz de continuar os trabalhos (Brasil, 1915).

A Lei Calógeras nunca entrou em vigor (Paiva, 1967, p. 7). Já o conselho, como indicam as poucas referências localizadas nos relatórios ministeriais e no Diário Oficial, teve seus trabalhos iniciados logo após a sua criação (Brasil, 1916, p. XXV).

No entanto, em 1921, o decreto n. 4.265, de 15 de janeiro, que regulou, novamente, a propriedade e a exploração das minas, criou, mais uma vez, o Conselho Superior das Minas, com as mesmas funções descritas na Lei Calógeras. Esse decreto ficou conhecido como Lei Simões Lopes, nome do ministro que ocupava a pasta da Agricultura no momento, e foi considerado por alguns autores como o primeiro código de minas do país (Paiva, 1967, p. 7; Ribeiro, 2006, p. 7). O ato manteve a distinção entre mina e solo, e avançou no estabelecimento de disposições e procedimentos sobre descobertas, licenças de pesquisa e concessão de lavras das minas pertencentes à União, dispositivos que foram ampliados no regulamento aprovado pelo decreto n. 15.211, de 28 de dezembro de 1921.

No que se refere à legislação sobre as minas na Primeira República, ainda vale destacar a emenda constitucional de 3 de novembro de 1926, que reafirmou o pertencimento das minas ao proprietário do solo, salvo as limitações definidas por lei, e proibiu que as minas e jazidas necessárias à segurança e defesa nacionais fossem transferidas para estrangeiros.

Não foram localizadas informações sobre os trabalhos do conselho na década de 1920. E, apesar de sua manutenção ser mencionada em algumas versões de um anteprojeto de lei de minas elaboradas no início da década seguinte, o Código de Minas aprovado pelo decreto n. 24.642, de 10 de julho de 1934, não traz nenhuma referência sobre o órgão (Brasil, 1931, p. 19.064). A partir da chegada de Getúlio Vargas à Presidência da República, em decorrência dos acontecimentos que ficaram conhecidos como Revolução de 1930, ocorreu uma profunda mudança em relação à propriedade das minas, com o fim do sistema de acessão. O código de 1934 distinguiu a propriedade do solo da propriedade das minas e demais riquezas do subsolo, o que foi referendado pela Constituição promulgada poucos dias depois, em 16 de julho, determinando também que o aproveitamento industrial das lavras ou jazidas, assim como das quedas d’água, mesmo de propriedade privada, dependeria de autorização ou concessão federal na forma da lei (Brasil, 1934).

 

Angélica Ricci Camargo
Abr. 2020

 

Fontes e bibliografia

BRASIL. Decreto n. 2.933, de 6 de janeiro de 1915. Regula a propriedade das minas. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo. Rio de Janeiro, 7 jan. 1915, p. 297-301.

______. Decreto n. 4.265, de 15 de janeiro de 1921. Regula a propriedade e a exploração das minas. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo. Rio de Janeiro, 10 fev. 1921, p. 2823-1829.

______. Decreto n. 15.211, de 28 de dezembro de 1921. Aprova o regulamento relativo à propriedade e a exploração das minas. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, v. 6, p. 173-223, 1922.

______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Disponível em: https://bit.ly/3b7v4Hk. Acesso em: 22 abr. 2020.

______. Emendas à Constituição Federal de 1891, de 3 de setembro de 1926. Disponível em: https://bit.ly/3egf8Vi. Acesso em: 22 abr. 2020.

______. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 16 de julho de 1934. Disponível em: https://bit.ly/2VqfO31. Acesso em: 22 abr. 2020.

______. Relatório apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil pelo ministro de Estado da Agricultura, Indústria e Comércio José Rufino Bezerra Cavalcanti no ano de 1916. Rio de Janeiro, s.e., 1916. Disponível em: https://bit.ly/2wZpEzy. Acesso em: 22 abr. 2020.

______. [Esboço do anteprojeto provisório da lei de minas elaborado pela comissão legislativa do Ministério da Justiça e Negócios Interiores]. Diário Oficial da República dos Estados Unidos do Brasil. Poder Executivo. Rio de Janeiro, 30 nov. 1931, p. 19.056-19.064.

CORRÊA, Maria Letícia. Regime de propriedade de minas e jazidas na Primeira República brasileira: revisitando o caso das minas de Itabira e os interesses em disputa. Tempos Históricos, Marechal Cândido Rondon (PR), v. 22, p. 202-224, 2018. Disponível em: https://bit.ly/2zjsFeS. Acesso em: 22 abr. 2020.

FEITOSA, Maria Luiza Pereira de Alencar Mayer; ATAÍDE, Pedro Henrique Sousa. Marco regulatório da mineração no Brasil: disputa pelo direito humano ao desenvolvimento e o direito econômico do desenvolvimento. Revista de Direito da Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 1, p. 7-30, 2017.

NOGUEIRA, Jenny Magnani de Oliveira. Aspectos do domínio mineral e as diretrizes constitucionais do setor.  Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis-SC, 1997. Disponível em: https://bit.ly/2RTmrsk. Acesso em: 22 abr. 2020.

PAIVA, Alfredo de Almeida. A evolução do direito das minas e a Constituição de 1967. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 90, p. 1-22, jul. 1967. Disponível em: https://bit.ly/3cBGOSV. Acesso em: 22 abr. 2020.

RIBEIRO, Carlos Luiz. Direito minerário escrito e aplicado. Belo Horizonte: Del Rey, 2006.

SARMENTO, Daniel de Moraes. A propriedade mineral segundo o regime Res Nullius vigente no Brasil. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 124, p. 356-372, abr./jun. 1976. Disponível em: https://bit.ly/2Vo1vfs. Acesso em: 22 abr. 2020.

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_23 Decretos do Executivo - Período Republicano

 

Referência da imagem

Arquivo Nacional, Fundo Percival Farquhar, BR_RJANRIO_SC_0_FOT_2

 

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