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Diretoria-Geral de Saúde Pública

Publicado: Quarta, 25 de Julho de 2018, 18h19 | Última atualização em Segunda, 07 de Março de 2022, 12h12 | Acessos: 17975

Criada pelo decreto n. 2.449, de 1º de fevereiro de 1897, a partir da unificação das duas repartições federais responsáveis pela profilaxia marítima – a Inspetoria Geral da Saúde dos Portos – e terrestre – o Instituto Sanitário Federal. Subordinada ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, a Diretoria-Geral de Saúde Pública tinha por competência o estudo da natureza, etiologia, tratamento e profilaxia das moléstias transmissíveis, apresentação ao governo do plano de socorros sanitários a ser prestado aos estados que o solicitassem, o preparo das culturas atenuadas e soros antitóxicos e curativos a serem fornecidos às autoridades que os reclamassem, a fiscalização do exercício da medicina e da farmácia, a organização das estatísticas demógrafo-sanitárias, a direção do serviço sanitário dos portos e a elaboração do Código Farmacêutico Brasileiro.

Com a Proclamação da República e a promulgação da Constituição de 1891, houve um rearranjo no modelo da administração pública, que deveria adequar-se ao sistema federalista, que garantiu a autonomia de seus estados-membros e a diminuição de poder do governo central, verificado ao longo do Império. Os artigos 3º e 4º das disposições transitórias da Constituição, regulamentados pelo decreto n. 438, de 11 de junho de 1891, determinou que cessasse a responsabilidade do governo federal com a administração dos serviços que lhe competiam, inclusive o pagamento do respectivo pessoal, à proporção que os estados se organizassem. Na prática a transferência aos estados e municípios de serviços antes afetos ao governo federal foi um processo longo e complexo, que se deu de forma diferenciada, o que obedeceu à diversidade socioeconômica entre as unidades federadas.

Assim, sob o federalismo aprovado pela Constituição, a União somente poderia intervir nos estados quando fosse solicitada ou em casos de epidemia de rápida disseminação que atingisse mais de um estado. Um dos efeitos da descentralização foi a transferência da higiene terrestre aos estados, que a partir desta data instituíram serviços estaduais de saúde pública. Para cumprimento dessas alterações ainda em 1892 foi extinta a Inspetoria-Geral de Higiene, pelo decreto n. 1.172 de 17 de dezembro, e desligadas da administração federal as inspetorias de higiene existentes nos estados. A situação singular do Distrito Federal foi tratada pela lei n. 26, de 30 de dezembro de 1891, incumbindo-lhe os serviços concernentes à higiene e à polícia sanitária, limpeza urbana, desinfetórios e assistência à infância. A cargo da administração federal ficavam o estudo, a profilaxia e o combate às moléstias endêmicas e epidêmicas, as pesquisas feitas no Instituto de Higiene, a estatística demógrafa-sanitária, o exercício da medicina e da farmácia, as análises qualitativas e quantitativas de substâncias importadas, e o serviço sanitário marítimo dos portos.

No entanto, os limites à configuração da estrutura dos serviços de saúde que emergiu com a Constituição de 1891 logo foram sentidos. A execução das atribuições sob encargo da União esbarrava na falta de pessoal e material, bem como na imprecisão na delimitação das responsabilidades dos governos federal e municipal no tocante à higiene defensiva no Distrito Federal (Brasil, 1897). O relatório ministerial dos anos de 1896 e 1897 indicava ainda um outro elemento nessa difícil equação entre arranjo federativo na saúde pública, isto é, a dificuldade financeira de muitos estados em estruturar seus serviços de saúde. O resultado dessa limitação seria a doença atingir os estados vizinhos, evidenciando a ‘consciência da interdependência sanitária’ (Hochman, 1998, p. 39), o que reforçaria a argumentação de que somente a União teria condições para promover a uniformidade e a continuidade das ações sanitárias relativas à importação e à disseminação das doenças, sendo a única exceção o estado de São Paulo (Brasil, 1896, p. 264).

A proposta de reorganização dos serviços de saúde já constava da lei n. 429, de 10 de dezembro de 1896, que fixou a despesa geral da União para o exercício de 1897. A ideia de centralização e uniformização das ações de saúde, subordinadas ao governo federal, sem ferir a autonomia estadual, pautou a criação da Diretoria-Geral de Saúde Pública. O decreto dividiu o litoral brasileiro em três distritos sanitários: o 1º distrito, com sede na Capital Federal, seria constituído pelas inspetorias de Saúde dos Portos de Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso; o 2º distrito, com sede no porto do Recife, era formado pelas inspetorias de Saúde dos Portos de Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e Bahia; o 3º distrito, com sede no porto de Belém, compunha-se pelas inspetorias de Saúde dos Portos de Amazonas, Pará, Maranhão, Ceará, Piauí, e Rio Grande do Norte. Na Capital Federal a Diretoria-Geral contava com o diretor-geral, Secretaria, Laboratório de Bacteriologia, Gabinete Demógrafo-Sanitário, Diretoria Sanitária do Porto do Rio de Janeiro, sede do 1º distrito sanitário; lazaretos e hospitais marítimos.

Em 1902, pelo decreto n. 4.463, de 12 de julho, o governo federal assumiu o serviço de higiene defensiva na capital da República, que havia sido transferido pela lei n. 85, de 20 de setembro de 1892, incorporando-o às atribuições da Diretoria-Geral de Saúde Pública. A situação sanitária da cidade tornara-se há muito uma constante preocupação para o governo, desde a segunda metade do século XIX. A situação agravara-se, a recorrência de epidemias como febre amarela, peste bubônica e varíola traziam enormes prejuízos econômicos – num período em que o surto cafeeiro sustentava a economia nacional – e afugentava imigrantes europeus. A questão da reforma urbana, o saneamento urbano e a modernização do porto tornaram-se as principais bandeiras do presidente recém-eleito, o ex-governador paulista Francisco de Paula Rodrigues Alves (1902-1906).

Em 1903, Rodrigues Alves nomeia o engenheiro Francisco Pereira Passos prefeito do Distrito Federal, com a missão de levar à frente o projeto de reurbanização da cidade, cabendo aos engenheiros Francisco Bicalho a reforma do porto e Paulo de Frontin as reformas no centro do Rio de Janeiro, com a abertura da Avenida Central (atual Rio Branco), da Avenida do Cais (atual Rodrigues Alves) e do Canal do Mangue. Para a Diretoria-Geral de Saúde Pública é nomeado o médico Oswaldo Gonçalves Cruz, responsável pelo controle dos surtos epidêmicos. Já em 5 de janeiro de 1904 foi aprovado o decreto n. 1.151, que reorganizava os serviços da higiene a cargo da União, que ampliou as atribuições da DGSP, encarregada da higiene domiciliária, da polícia sanitária, bem como da profilaxia geral e específica das moléstias infecciosas no Distrito Federal.

O novo regulamento dos serviços sanitários a cargo do governo federal foi aprovado pelo decreto n. 5.156, de 8 de março de 1904, que definiu as atribuições do governo federal nos estados e no Distrito Federal. Além de ampliar as competências da DGSP, o decreto instituiu ainda o Juízo dos Feitos da Saúde Pública no Distrito Federal, com a função de conhecer de todas as ações e processos civis e criminais em matéria de higiene e salubridade pública, e o Serviço de Profilaxia da Febre Amarela, responsável pela profilaxia da doença na cidade, regulamentado na mesma data pelo decreto n. 5.157.

Para execução desses serviços, a DGSP compunha-se de: Secretaria; 10 (dez) delegacias sanitárias em toda a cidade do Rio de Janeiro; Laboratório de Bacteriologia; Seção Demográfica, Seção de Engenharia Sanitária, Inspetoria de Profilaxia da Febre Amarela, Inspetoria de Isolamento e Desinfecção, Inspetorias de Saúde nos portos dos estados do Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Paraíba, Pernambuco, Sergipe, Alagoas, Bahia, Amapá, Maranhão, Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte, Hospital São Sebastião, Hospital Paula Cândido, Lazareto da Ilha Grande e Instituto Soroterápico.

Ainda em 1904, a lei n. 1.261, de 31 de outubro, tornou obrigatória a vacinação e a revacinação contra a varíola em toda a República, que foi o mote para a irrupção da Revolta da Vacina. A revolta popular pode ser creditada a uma soma de fatores como as mudanças à remodelação urbana, que desapropriou e demoliu cortiços, a enorme concentração de poder de Pereira Passos e Oswaldo Cruz, que gerou um intenso debate, além de disputas entre a elite política em torno das medidas efetuadas por Rodrigues Alves. Ainda assim, a situação sanitária do Rio de Janeiro teve uma significativa melhora, e as campanhas para o controle das epidemias obtiveram sucesso, especialmente com a febre amarela e a peste bubônica.

Pelo decreto n. 9.157, de 29 de novembro de 1911, a DGSP recebeu um novo regulamento. O principal objetivo foi a reorganização sanitária dos portos marítimos e fluviais das capitais litorâneas, fruto da viagem de inspeção realizada por Oswaldo Cruz, entre setembro de 1905 e fevereiro de 1906. A estrutura dos serviços compunha-se de Inspetoria de Profilaxia do Porto do Rio de Janeiro, Inspetoria de Polícia Sanitária do Porto do Rio de Janeiro, 19 (dezenove) inspetorias de saúde dos portos nos estados, classificadas em: 1ª classe, com sede nos portos de Manaus, Belém, Recife, Salvador, Santos e Rio Grande do Sul; 2ª classe, com sede nos portos de São Luís, Fortaleza, Vitória, Paranaguá e Corumbá; 3ª classe, com sede nos portos de Amarração, Natal, Cabedelo, Maceió, Aracaju e Florianópolis e 4ª classe, com sede nos portos de Itajaí e São Francisco.

No entanto, o aumento pela demanda dos serviços de saúde evidenciava os limites da atuação do governo federal nos estados. As ações empreendidas pelos serviços federais de saúde na gestão de Rodrigues Alves estiveram circunscritas ao Distrito Federal, voltadas especialmente para o saneamento urbano, a higiene dos portos e o controle das epidemias. A década de 1910, especialmente a partir de 1916, foi marcada pelo engajamento da elite brasileira no chamado movimento sanitarista, que deflagrou uma campanha pelo saneamento rural e o combate às endemias, somente possível com a maior centralização e expansão dos serviços federais de saúde.

Foi nessa conjuntura que nova reforma da DGSP foi aprovada, pelo decreto n. 10.821, de 18 de março de 1914, com pequenas alterações em sua estrutura. A Inspetoria de Profilaxia da Febre Amarela e a Inspetoria de Isolamento e Desinfecção foram fundidas, dando origem à Inspetoria dos Serviços de Profilaxia, o que já havia sido previsto pela lei n. 2.738, de 4 de janeiro de 1913, que aprovou o orçamento geral da União. A nova inspetoria tinha como encargo a prevenção sobre as moléstias infecciosas, definido como de notificação compulsória beribéri, cólera, difteria, disenteria bacilar, escarlatina, febre amarela, impaludismo, infecção puerperal, lepra, meningite cérebro-espinhal, oftalmia dos recém-nascidos, paralisia infantil ou moléstia de Heine-Medin, peste, sarampo, tifo ou febre tifoide, tracoma, tuberculose e varíola. Sua atuação abrangia a notificação da doença, o isolamento dos acometidos, a desinfeção dos objetos e locais contaminados e a vigilância médica dos comunicantes ou oriundos de lugares suspeitos. O ato criou ainda a Inspetoria de Farmácias, com a atribuição de fiscalizar o exercício da farmácia, verificar reclamações e denúncias sobre o tema, bem como apreender medicamentos ou preparados sob a suspeita de falsificação ou não licenciados.

A constatação da ausência do Estado na condução de uma política sanitária centralizada, associada à incapacidade econômica de alguns estados em conduzir seus serviços sanitários, serviram de argumentos para a ampliação dos serviços de profilaxia rural no Distrito Federal e nos estados. Pelo decreto n. 13.000, de 1º de maio de 1918, foi instituído o Serviço de Medicamentos Oficiais, diretamente subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores, voltado para o fornecimento de quinina, utilizada no combate à malária. Na mesma data foi aprovado ainda o decreto nº 13.001, que criou o Serviço de Profilaxia Rural, igualmente independente da DGSP, que permitiria a atuação do governo federal nos estados, por meio da assinatura de acordos de cooperação, através das comissões de saneamento e de profilaxia rural.

A campanha pelo saneamento dos sertões, capitaneada pela Liga Pró-Saneamento do Brasil, e que teve em Belisário Pena seu representante mais emblemático, postulava a criação de um Ministério da Saúde. Apesar das vitórias obtidas com a inclusão do combate às endemias rurais dentre os objetos das políticas públicas formuladas pela União, não conseguiram êxito na sua principal reivindicação. O decreto n. 3.987, de 2 de janeiro de 1920, reorganizou os serviços sanitários federais, extinguiu a Diretoria-Geral de Saúde Pública e criou o Departamento Nacional de Saúde Pública, órgão que era subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores. A criação do DNSP foi considerada o início da nacionalização das políticas de saúde e saneamento no país, tendo sido nomeado Carlos Chagas para diretor.

 

Dilma Cabral
Abr. 2018

 

  

Fontes e bibliografia

 BRASIL. Decreto n. 2.449, de 1º de fevereiro de 1897. Unifica os serviços de higiene da União. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, parte 2, p. 76-78, 1897. 

______. Decreto n. 2.458, de 10 de fevereiro de 1897. Aprova o Regulamento da Diretoria-Geral de Saúde Pública e a tabela de vencimentos do respectivo pessoal. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, parte 2, p. 90-128, 1897. 

______. Decreto n. 4.463, de 12 de julho de 1902. Avoca para a administração federal o Serviço de Higiene Defensiva na Capital da República. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 2, p. 289-290, 1903. 

______. Decreto Legislativo n. 1.151, de 5 de janeiro de 1904. Reorganiza os serviços da higiene administrativa da União. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 3-11, 1904. 

______. Decreto n. 5.157, de 8 de março de 1904. Aprova o Regulamento do Serviço de Profilaxia da Febre Amarela. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 289-302, 1904. 

______. Decreto n. 5.156, de 8 de março de 1904. Dá novo Regulamento aos serviços sanitários a cargo da União. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 205-289, 1904. 

______. Lei n. 1.261, de 31 de outubro de 1904. Torna obrigatória, em toda a República, a vacinação e a revacinação contra a varíola. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 109, 1907. 

______. Decreto n. 9.157, de 29 de novembro de 1911. Reorganiza os serviços de polícia sanitária e de profilaxia nos portos da República. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 3, p. 1011-1014, 1911. 

______. Lei n. 2.544, de 4 de janeiro de 1912. Fixa a despesa geral da República dos Estados Unidos do Brasil para o exercício de 1912. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 26-31, 1912. 

______. Decreto n. 10.821, de 18 de março de 1914. Dá novo Regulamento à Diretoria-Geral de Saúde Pública. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 860, 1916. 

______. Decreto Legislativo n. 3.987, de 2 de janeiro de 1920. Reorganiza os serviços da saúde pública. Coleção das leis da República dos Estados Unidos do Brasil, Rio de Janeiro, v. 1, p. 1-6, 1920. 

______. Relatório dos anos de 1896 e 1897 apresentado ao presidente da República dos Estados Unidos do Brasil em março de 1897. Disponível em: https://goo.gl/2FDrDz. Acesso em: 16 mar. 2018. 

CABRAL, Dilma. Lepra, medicina e políticas de saúde no Brasil (1894-1934). Rio de. Janeiro: Fiocruz, 2013. 

CASTRO SANTOS, L. A. de. O pensamento sanitarista na Primeira República: uma ideologia de construção nacional. Dados – Revista de Ciências Sociais, 28(2): 193-210, 1985. 

HOCHMAN, G. A Era do Saneamento: as bases da política de saúde pública no Brasil. São Paulo: Hucitec, Anpocs, 1998.

 

 

Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional

BR_RJANRIO_23  Decretos do Executivo - Período Republicano

BR_RJANRIO_OI   Diversos GIFI - Caixas e Códices

BR_RJANRIO_AF  Série Justiça - Administração (IJ2)

BR_RJANRIO_AI   Série Justiça - Gabinete do Ministro (IJ1)

BR_RJANRIO_BF  Série Saúde - Higiene e Saúde Pública - Instituto Oswaldo Cruz (IS4)

 

Referência da imagem

Avenida do Mangue. Estereoscopia Rodrigues & Co. Rio de Janeiro, [1890-1900]. Fotografias Avulsas. BR_RJANRIO_O2_0_FOT_444_24

 

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